vertigem

CRÔNICAS

gabis

1/9/20252 min read

Sinto a partida do mundo e a minha chegada. Sinto o cheiro do novo e o sabor do outro. Sinto, também, as dores que me afligiram há muito e que, sem mais nem menos, voltaram. Voltaram ainda mais fortes e intensas. Será que passarão? Será que eu, frágil, sou capaz de suportar a retomada de um sofrer que quase fez com que o hoje não existisse?

Olho para o alto numa tentativa de pedir socorro. As luzes que tecem o que paira sobre mim, extremas, provam minha incompetência de lidar com a naturalidade das coisas. A vida me faz pensar que tudo o que tenho é quociente da sorte e o que eu não tenho é fruto da falta, do oco, de uma culpa, minha, de não ser suficiente para lutar ou, ao menos, tentar.

Quando retorno o olhar ao chão, percebo que a ida para cima foi em vão. Percebo, ainda, que curvar a atenção aos pólos é uma escolha infeliz. Agora, vendo meus pés, entendo que existe uma biografia que passou despercebida enquanto minhas ambições me faziam olhar o que ainda não existia.

Começo a andar.
Paro.
Minhas pernas estão cansadas de fugir da reflexão.

Uma anunciação iluminada atrai minhas pupilas e, instintivamente, repito a ação de olhar para o alto. Num flash de segundos inconscientes, esperanço novidade, penso na possibilidade de a experiência ser positiva. Pelo menos dessa vez.

Me frustro.
Volto a andar.
Paro.

Depois de muito tempo sem saber o que fazer, compreendo minha necessidade de olhar para o caminho; para a frente; para os lados e, até, para trás. A estética do possível, do alcançável, do palpável e do visível me traz um conforto que o céu e o inferno não traziam. No momento, ocupo o delicioso e terrível lugar-comum. A zona. O conforto.

Retomo a caminhada.
A reta final se aproxima.

A dois passos de terminar o trajeto, coloco em prática a reflexão do “olhar à minha altura” e viro de costas. Enxergo o caminho que percorri e o quanto mudei de lá para cá. Não sei as consequências desse novo eu, diferente de um inseguro que não sabia aguentar os tremores dos ossos inferiores causados pelo medo de correr. Não sei, também, se a mudança realmente aconteceu.

Termino.
Penso voltar.
Quem sabe um dia mudo de novo.

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